Quando?

Escurece e eu corro para o carro. Pode ser que chegue a casa ainda com a luz do entardecer. A escuridão ameaça abater-se sobre a cidade consumindo prédios, estradas e transeuntes. O vento fresco deste final de tarde arrefece-me a pele acostumada ao sopro quente do verão, os jacarandás choram lágrimas púrpuras e eu, homem regressado a rapaz pequeno, enrolo-me no carro com medo da noite. E como não há medo que a impeça sei que ela chegará e me vestirá de negro, que me soprará saudades rasgadas do fundo de um tempo que nunca deveria ter vivido e que dispersará todas as bem-aventuranças que seguro entre estas duas mãos outra vez tão pequenas. Os candeeiros murmuram melancolias eléctricas e entro no bar de sempre. Um martini para afagar a solidão que será sempre a minha companheira de copos. Um choro contido. Logo hoje que acordei e soube que ia ser feliz.
(imagem: "Auto-retrato", por Karabchievsky)